sexta-feira, 10 de julho de 2020

Manhãs de Inverno


É possível imaginar que algumas manhãs de inverno são um presente que a natureza concede para as peles que sabem degustar do contato com a realidade. Algumas peles são insensíveis à vida, ao mundo total. Elas não caminham com o vento. Outras são um festival; uma salada de tatos. São inquietas, cheias de meninices e astúcias.

Acho que nos moldes celestiais deve haver a categoria daqueles que têm a pele para as manhãs de inverno. Uma classe especial de seres comuns. Eles acordam, tomam café, trabalham, assistem TV e dormem com alguma dificuldade. Alguns acreditam em Deus, outros não.

São esses que em segredo do vulgar e da plasticidade das horas, deleitam-se nas carícias do sol. O solzinho sereno das manhãs de inverno. Sentir o passar da brisa nem parece ser tão clichê assim; soa mais como um ato de redenção. Simplesmente as coisas  começam a se comportar como se fizessem parte de um ideal que funciona.

E por um segundo o mundo é terno, não dá medo, não mata. É um lugar lúcido em que sim é sim e não é não.

Ai como quero que no paraíso os invernos sejam longos e cheios de sóis mansinhos!

segunda-feira, 22 de junho de 2020

Dentro


em alguma fresta escondida da realidade
num submundo de mim
te encontro sereno e desperto
revolvendo os jardins da minha loucura
como se esperasse pela borealidade que não vem
toda a coisa que aí está é viva e é outra coisa que não eu
eu te digo e repito como se não tivesse dito
toda a coisa que aí está não sou eu
ignoras
porque teu coração é feito de coragem
porque a tua vontade é a tua vontade
porque tu és uma parte que muito vê
o seu amor ignora minha voz
que não é minha
que quer te arrancar dolorosamente deste lugar
porque o teu doce olhar
diz que sou eu
eu
que belissimamente vivo
corro e escapo de ti.